Usuários enfrentam desconforto, trepidações extremas e ônibus em más condições enquanto aguardam soluções prometidas pelo poder público e empresas de transporte.

A promessa de uma paisagem encantadora entre as praias do Sul de Torres contrasta com a realidade vivida por quem depende diariamente da Linha Paraíso. O trajeto, que deveria ser um facilitador de mobilidade entre bairros e balneários, tornou-se sinônimo de desconforto e abandono.
Relatos de usuários são unânimes: estar dentro dos ônibus da Linha Paraíso é como viver dentro de um liquidificador. A comparação não é exagerada. As condições precárias das estradas de terra provocam uma trepidação constante durante todo o trajeto, tornando o percurso cansativo e até perigoso.
A situação chegou ao ponto de, como dizem moradores da região, parecer que o motorista da linha está operando uma britadeira, tamanha é a trepidação provocada pelas crateras e buracos da via. A paisagem natural dá lugar ao mal-estar causado pelas oscilações bruscas do veículo.
VEÍCULOS EM MÁS CONDIÇÕES
As queixas dos usuários não se restringem apenas ao estado das vias. Muitos reclamam das condições dos próprios ônibus que fazem o transporte. Segundo relatos, os veículos utilizados na linha estão velhos, mal conservados e pouco adequados para o tipo de terreno, agravando ainda mais o desconforto e a insegurança dos ageiros.
A empresa Torrescar, responsável pela operação da Linha Paraíso, reconhece os problemas. Em nota, informou que não é possível utilizar os seus melhores veículos na linha devido às péssimas condições das estradas. A empresa alega que, enquanto não houver melhorias viárias, os veículos mais novos e confortáveis correm risco de avarias frequentes, o que inviabilizaria a operação.
Em contato com o Departamento de Comunicação da Prefeitura de Torres, foi informado que está em andamento a contratação de uma empresa especializada para realizar um estudo de viabilidade do transporte coletivo no município. A medida visa propor soluções sustentáveis e eficazes para a mobilidade urbana, incluindo linhas como a Paraíso.
INTERPRAIAS ASFALTADA
Uma alternativa concreta para a melhoria da mobilidade seria o asfaltamento da Estrada Interpraias, que, segundo previsão da Prefeitura, deve ser concluído até novembro. Com a nova pavimentação, espera-se que o transporte na região Sul de Torres ganhe em qualidade, pontualidade e conforto.
E LIVRE

O vereador Moisés Trisch (PT) apresentou ainda em 2024, uma indicação ao Poder Executivo para a implantação do e Livre Pleno no município, seguindo o modelo de Tarifa Zero adotado com sucesso em mais de 90 cidades brasileiras. A proposta visa beneficiar especialmente estudantes, idosos e trabalhadores de baixa renda, garantindo mobilidade gratuita e incentivando o uso do transporte coletivo.
A iniciativa foi aprovada pelo Legislativo em sessão realizada no dia 24 de março de 2024. No entanto, como se tratava de uma indicação ao Executivo, na época, não obteve retorno do gestor municipal. De acordo com o vereador Moisés, a medida traria uma série de vantagens para a população e para a economia local.
“Se deixado como está, o transporte público vai fechar. Quem mais vai sofrer são jovens, idosos e trabalhadores de baixa renda. Com o e Livre, o uso de ônibus vai aumentar e poderemos ter mais linhas, itinerários e horários”, acredita.
A ideia do vereador é custear o serviço público por meio de parcerias público-privadas e da arrecadação do estacionamento rotativo, além da possibilidade de taxas específicas para empresas, publicidade nos ônibus e destinação de parte das multas de trânsito para subsidiar o transporte coletivo.
“Muitos prefeitos relatam que a Tarifa Zero aumentou o movimento no comércio, impulsionando a arrecadação do ISS. Em Torres, em breve teremos recursos novos do estacionamento rotativo, que pode ser usado para esse fim”, explica o vereador.
O prefeito de Torres, Delci Dimer, com mais de 30 anos de experiência no setor de transporte público e um dos fundadores da Torrescar, empresa que opera na cidade, reconhece a necessidade de subsídios para manter o serviço funcionando.
“Hoje, manter o transporte coletivo sem subsídio é inviável. Não é só aqui, mas em muitos municípios. Precisamos encontrar uma solução para garantir que o serviço continue e atenda a população”, afirmou o prefeito.
Embora o prefeito tenha se mostrado interessado na proposta, ele destaca que a implementação do transporte gratuito depende de um estudo técnico detalhado.
“Minha vontade é que tenhamos transporte gratuito, mas é preciso resolver uma série de fatores antes disso. Antes do transporte gratuito, é necessário implantar o estacionamento rotativo. O tema está em fase de estudo, para analisar roteiros, custos e o modelo de implantação. Teremos respostas no segundo semestre deste ano”, afirmou o prefeito.
De acordo com a diretora da Torrescar, que presta o serviço em Torres, Renata Guimarães Dimer, a empresa vê a possibilidade somente como uma ideia, que ainda está em um começo.
Renata destaca também, que em caso de implantado o sistema de e livre, o usuário será beneficiado com a isenção da tarifa e também com o aumento do número de linhas, pois onde há tarifa zero, foi necessário o aumento, quase que dobrando o número.
Em geral, para o usuário só há benefícios, porém, se caso o projeto andar, a prefeitura terá que apresentar o estudo de como isso deve ser feito na cidade.
LINHA ROÇA DA ESTÂNCIA
Na esfera intermunicipal, a situação também é crítica. A linha Roça da Estância, anteriormente operada pela Torrescar e agora com a empresa São José, está desativada. A empresa justificou a suspensão alegando falta de estrutura da estrada e baixa viabilidade econômica. Alega ainda que 95% dos ageiros embarcavam e desembarcavam dentro do município de Torres, o que, segundo a empresa, configuraria responsabilidade do poder municipal.
Apesar da alegação de baixa viabilidade econômica, cerca de 25 pessoas utilizavam a linha Roça da Estância regularmente, segundo informações obtidas pela reportagem da Rádio Maristela. Especialistas e representantes comunitários defendem que, mesmo operando “no zero a zero”, a manutenção da linha é essencial, pois faz parte do dever público de garantir o direito à mobilidade.
TRANSPORTE PÚBLICO NA ESSÊNCIA

A mobilidade urbana é um tema de repercussão geral que diz respeito não apenas à forma como a população se transporta no seu cotidiano, mas está diretamente ligada à qualidade de vida das pessoas. Com intuito de formar uma rede única de transporte, organizada com linhas e rotas, que possam ter diferentes funções e modos de deslocamento e que possa ser universalizada, o Ministério das Cidades elaborou a minuta do projeto do Marco Legal do Transporte Público Coletivo, visando colaborar para o aprimoramento da Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) e organizar uma rede de transporte público coletivo formada por modos e serviços de transporte complementares.
O projeto de lei trata da reestruturação do modelo de prestação de serviços de Transporte Público Coletivo e traz princípios, diretrizes, objetivos e definições sobre o tema, além da organização e financiamento dos serviços de transporte e, também, aspectos sobre a operação, como a contratação de operadores e o seu regime econômico-financeiro.
A proposta trata da diversificação de modelos de contratação de serviços de transporte público coletivo, de instrumentos de financiamento ao setor e de subsídios ao funcionamento desse tipo de serviço. Outro ponto de destaque é a preocupação e a integração dos modais, que devem ser íveis física e economicamente, além da adoção de padrões de qualidade para a prestação dos serviços.
TRANSPORTE EM CRISE, POPULAÇÃO NO PREJUÍZO
Enquanto o ime entre operadoras, município e estrutura viária não se resolve, quem paga a conta é a população, obrigada a enfrentar viagens desconfortáveis, inseguras e com serviços limitados. A expectativa agora recai sobre o estudo da Prefeitura e as obras na Interpraias — únicas promessas concretas no horizonte. Até lá, moradores seguem à mercê da precariedade, enquanto esperam que o transporte público volte a cumprir sua função essencial: garantir o direito de ir e vir com dignidade, eficiência e segurança. O tempo a, os ônibus continuam a sacolejar por estradas esburacadas, e a tão falada mobilidade urbana segue sendo um direito distante para muitos.