Escrevo esta coluna no dia primeiro de abril. O dia da mentira. Mais uma das criações culturais do mundo ocidental (leia-se Europa) que encontrou abrigo por estes lados da América. Não há uma precisão histórica, mas tem a ver com alterações de calendário marcadas pela era de revoluções modernas, especialmente na França.
O fato é que chegou também ao Brasil pelo caminho das cortes e nobreza.
Quando mais jovem, era uma data significativa. Poder enganar alguém na manhã deste dia era um feito louvável. Ser pego numa mentira era atestado de bobice. Valia a brincadeira. Espertalhão ou tolo do dia, tudo era tolerado e virava motivo de fartas gargalhadas. Até grandes veículos de imprensa já entraram na roda da brincadeira com notícias de impacto, logo desmentidas, é claro.
Vejo que hoje já não tem mais tanto peso. Não observei, em meu entorno, alguém que fizesse referência a esta data.
E então fico a pensar se uma das causas não seria o fato de que a mentira deixou de ser brincadeira e ou a ser algo levado a sério. Não mais se brinca com as mentiras. aram a ser tratadas como verdades. Para não ficar tão feio, amos a adotar até um nome chique: Fake News. Para os mais chegados, apenas fake.
Para quem leva a sério o debate, surgiu outro conceito: pós-verdade. Uma referência a um novo tempo cultural onde o entendimento da verdade ou a ser outro.
A cultura ocidental moderna (mais uma vez) afirmou-se a partir da ciência experimental como caminho de conhecimento e construção das verdades. As evidências científicas eram os únicos caminhos comprovadamente verdadeiros. Critério de verdade. Até mesmo para os crentes, não haveria outra lógica. Sendo verdade, tínhamos a obrigação de acreditar.
A concepção de pós verdade parte de outro princípio: se eu acredito, então é verdade. Não mais as evidências, mas a origem das afirmações. Mentira deixou de ser exclusividade de tolos. ou a ser ferramenta de “espertos”. E tudo isto num momento revolucionário no campo das comunicações. Nunca foi tão fácil divulgar e espalhar uma informação. Verdade ou não é uma questão de opção.
Saudades do tempo em que mentir era uma brincadeira de um dia.