Esta coluna traz por identidade “Provocações” não apenas pela pretensão de produzir um pensamento provocativo senão também reagir diante de provocações que o cotidiano oportuniza.
Difícil não se sentir provocado pelo tema “bebê reborn”.
Nestes últimos dias as redes sociais estão dando destaque para a questão. Pelo que pude apurar, o tema ganhou repercussão a partir de uma questão judicial em que um casal disputou na justiça o direito de posse ou propriedade de um bebê reborn.
A pretensão é construir um bebê, de forma artesanal, com o máximo de realismo nos traços e expressões. A ponto do nome “reborn” trazer a ideia de algo que renasce. Algo que recebe vida a partir de sua aquisição. E não se trata de um objeto barato. Modelos mais personalizados de silicone podem chegar a R$ 10.000 ou até R$ 15.000.
Ganhando destaque, multiplicam-se os exemplos de “adoção”. Numa busca pela aproximação idealizada de um real, a relação extrapola o manuseio físico. Avança para o espaço sentimental. Com direito, inclusive, a visitas médicas.
Pipocam também comentários e artigos interpretativos. De forma mais comum, apontando para a “brincadeira” como uma manifestação doentia. Não apenas de pessoas, mas especialmente como a expressão de um coletivo adoecido. Uma sociedade doente.
O que me causa um certo conforto é o fato de que não se trata de algo novo. Alguns devem lembrar a febre dos “tamagotchi”, um entretenimento virtual em que as pessoas – geralmente jovens e adolescentes, adotavam um “ovo irável” (essa é a tradução), e assumiam o compromisso de cuidar no desenvolvimento, oferecendo cuidados, água e alimentos virtuais. Foi um momento ou uma onda que já teve seu estouro e foi se desfazendo.
Como aponta o filósofo Bauman, estamos numa sociedade caracterizada pela fluidez, em que valores e escolhas são águas que am.
E aí entra meu conforto. Pode simplesmente ser mais uma onda que a. Sintomática e expressão de uma sociedade adoecida, mas num ciclo viral. Isso ará para então dar lugar a outras viroses.
Preocupante porque não é brincadeira de crianças e adolescentes. Ou, então, resultado de uma sociedade que resiste em amadurecer e atingir a maioridade já comentada por outro filósofo do século XVIII, Kant.